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Ao meu amor: Helena

24 maio

Acompanho o desenvolvimento da Helena desde sua concepção. Sim, isso mesmo! Desde sua concepção. 5 de setembro de 2020. Essa foi a data em que Helena foi gerada. Uma noite quente, antevéspera do feriado de 7 de setembro. Uma noite feliz de calor em Ubatuba, um paraíso na Terra. Estávamos reclusos no apartamento, já que o período pandêmico ainda assombrava. Vivíamos um clima acinzentado, com receio do amanhã. O horizonte estava bem distante do nosso querer. O mundo exalava interrogações.

          Semanas depois, veio a notícia de que um bebezinho havia sido concebido. A primeira informação foi um teste rápido. A chancela veio do laboratório. Eu iria ser pai! Depois de viver tantos sentimentos de outras pessoas, eu não conseguia descrever quais eram os meus.  Qual o significado de ser pai que não fosse apenas o de genitor?

          Helena nasceu no dia 24 de maio de 2021, às 19h29min. Um parto difícil gravado por mim. Ainda que cesariana, a profissional médica estava completamente perdida. Helena virou e revirou dentro da mãe. Deu um baile na médica e veio ao mundo inerte. A massagem promoveu o primeiro chorinho de e o atendimento da excelente pediatra – que para mim é um anjo em nosso plano – permitiu que minha bebezinha não tivesse nenhuma sequela.

          Dois dias na Santa Casa acompanhando minha pequena. A mãe cansada do parto e eu completamente abismado com aquele serzinho que já segurou meu dedo ainda na incubadora, como se dissesse: “estou aqui, papai! Você me esperou por toda a vida e eu vim”.

          Sentimos amores por toda a vida. Cada amor diferente um do outro. Mas amor puro, verdadeiro, sem nenhum interesse é o amor de pai/mãe. Inexplicável ter a capacidade natural de gerar outro ser com inteligência, anseios, personalidade, caráter. Todo dia uma coisinha diferente. Uma palavrinha, um gesto, um carinho, um sorriso de ansiedade quando me vê chegando em casa na hora do almoço. Quando chego à noite, Helena já está dormindo. Para mim é uma imensa perda não sentir o sorriso dela ao final do dia.

Ela é a pureza da alma de criança num sorriso sincero com pouquinhos dentes. Helena é um presente! É um pingo de doçura no mar de tormentas.  Quando o céu está azul, lindo, daquele jeito que todos dizem “que dia lindo!”, para mim é Helena. Um pedacinho desse céu sem fim. Ela está crescendo e pode ter o céu como exemplo de liberdade. Para qualquer lado que se olhe, há infinitas possibilidades de ser e ir para onde quiser. Lutarei para que Helena brilhe por si, seja quem quiser; uma mulher de brio, força e coragem. Helena é a obra-prima de Deus! Seu primeiro aninho se completa hoje, um dia frio, porém bonito. O céu está azul. Limpo. Ele mostra para a Helena que o mundo é dela. Parabéns, filha linda! Obrigado por descobrir o melhor de mim que nem mesmo eu conhecia. Seu papai está aqui!

O fruto do caos

10 out

Coringa 2

      Em todo meu tempo analisando e admirando as Histórias em Quadrinhos, em especial aquelas que são adaptadas ao cinema, o filme Coringa (2019), do diretor Todd Phillips, merece especial atenção. Ambientado numa Gotham City dominada pela desigualdade social e estagnação econômica, magistralmente descrita em cenas coloridas com primor técnico, defende-se abertamente a tese do filósofo Jean-Jacques Rousseau de que o homem é produto do meio.

      Em “A Origem da Desigualdade entre os Homens”, publicado em 1755, Rousseau afirma que toda a noção de desigualdade limita-se aos princípios de propriedade particular criados essencialmente pelos homens e a insegurança de se viver com outros homens. E é nessa temática que o personagem central vive suas dores diárias.

      Arthur Fleck, um comediante fracassado, com transtornos psiquiátricos, magistralmente interpretado e encarnado por Joaquin Phoenix, cuida da sua mãe e tem como principal rival a sociedade como um todo. Nada que faz é suficientemente bom o bastante para convencer os outros de que ele é um ser humano que se esforça e precisa de cuidados. Assim como tantas outras representações do cotidiano de qualquer lugar, seres invisíveis sobrevivem com suas dores e sentimentos.

      Fleck tenta (con)viver com suas limitações e tem um emprego como palhaço numa empresa prestadora de serviços. Cuida de sua mãe, que também tem sérios problemas mentais, e vive cercado de pessoas que simplesmente não se importam com absolutamente nada que ele faça. Ele é mais um sobrevivente invisível de uma grande metrópole repleta de contradições e patologias sociais.

      Enquanto Gotham City imerge em problemas políticos, violência, criminalidade, os ricos vão acumulando bens e a sociedade se destoa doentiamente na segregação entre os privilegiados e os que têm a vida cerceada por problemas mundanos.

      Pelos moldes da teoria de Rousseau, os seres humanos bons por natureza são corrompidos pelos hábitos sociais. Dessa forma, percebe-se que a corrupção social pode tornar as pessoas nefastas. Na indecência de se possuir cada vez mais em terreno machucado pela irracionalidade e violência, as sobras humanas vão se inflando de desespero, solidão, marginalidade, preconceito. Assim, são criadas leis para normatizarem o crepúsculo do caos.

      Coringa é a representação da insatisfação aos ditames sociais, com a persistência do Estado em regrar até o último respiro dos humanos, de levar todos a uma consequência: a do desespero em não ter com quem contar. Coringa é um palhaço, metaforicamente feito de palhaço, por quem o Estado deveria zelar. Ele representa a parcela da sociedade que não conseguiu mais ficar presa ao conceito do bom selvagem de Rousseau. Ele representa o caos e a carnificina pelos quais as virtudes são massacradas dia após dia pela elite que alcançou a luz no inacabável túnel. É um filme louvável, causador de uma reflexão sobre o ser e o ter. Certamente, é o marco de uma revolução das adaptações de Quadrinhos ao cinema.

O muro de Trump

27 jan

trump

A vitória de Donald Trump nos Estados Unidos deixou até mesmo os americanos boquiabertos. Depois de um presidente que deixou seu povo respirando com tranquilidade, surge um truculento, disposto a rasgar o mantra americano de liberdade. Dentre seus rompantes, há a ideia da construção de um muro para segregar de vez duas nações.

                Já tivemos uma péssima experiência sobre divisão de países com um muro em 1961. A Alemanha foi dividida em Oriental e Ocidental simplesmente por ideologia político-econômica. A Oriental, com a capital em Berlim, tinha como controladora a União das Repúblicas Socialistas Soviéticas. Com a morte de Stalin, em 1953, houve uma violenta repressão e 3 milhões de pessoas fugiram para a Alemanha Ocidental. Não bastasse a divisão dos países, a capital Berlim também foi dividida.

                Em 1989, aconteceu a queda do Muro de Berlim. Tal fato representou também a derrubada de uma ideologia socialista que culminou no sofrimento de milhões de pessoas. Não quero defender aqui o capitalismo e suas desigualdades, mas todo regime imposto, seja político, religioso, ideológico ou econômico, tende a não dar certo; tende a levar o sofrimento.

                Com a derrubada do Muro, famílias se reencontraram, amores se reestruturaram, ideais se cruzaram. A Alemanha hoje é uma potência mundial por que teve condições e competência para se reerguer. Por mais que existam duas nações soberanas, México e EUA, a divisão da fronteira entre os dois países não é um marco apenas para a contenção de imigrantes, mas quase que um decreto da falência econômica dos latinos.

                Trump quer obrigar o vizinho a pagar a reforma da sua casa. Quer gastar U$ 20 bilhões e deixar a conta para o mais fraco. Sabe-se que o México depende dos EUA para sobreviver e a superpotência está usando sua influência para rebaixar e forçar os latinos a servi-la. 80% das exportações mexicanas vão para os EUA. Trump já começa a estudar meios para brecar a indústria mexicana por meio de aumento de impostos para produtos importados e redução de alíquotas para produtos nacionais.

                O muro é um símbolo da segregação e intolerância. A fiscalização da imigração poderia ser controlada, aumentada ou o que quer que os interesses americanos defendam, mas jamais o mundo deveria cair nessa onda de superioridade com a qual os EUA agora se blindam. Quem tem coragem de enfrentar Trump? Quem vai se posicionar? Parece que o México está sozinho. O muro não é apenas uma onipotência de fronteiras, mas uma barreira representativa a todos nós, latinos. Retrocedemos.

Fraudes da humanidade

14 dez

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Sou uma pessoa bastante reflexiva, por momentos até demais. Nesses pensamentos, muitas vezes inúteis, me pego analisando algumas coisas corriqueiras e percebo que a humanidade exalta aquilo que lhe convém e até mesmo chega a ser “maria-vai-com-as-outras”, seja lá de onde esse termo surgiu. A humanidade cria situações, elege suas coisas e objetos, designa aquilo que lhe convém. Vejamos:

  • O limão é um exemplo claro de uma das maiores fraudes da humanidade. É uma fruta pequena, feia e azeda. Não existe limão doce. Não é como o morango: a gente pode até comer um azedo, mas sabe que o outro poderá ser doce como o mel. O morango é lindo, gostoso, combina com tudo e é muito sensual. Nunca vi uma cena sensual num filme na qual os atores usam limão. Imagine a careta e o desestímulo dos atores se o usassem. Além disso, é preciso ter cuidado com a fruta. Ela é perigosa. Além de azeda, feia, pequena, ela machuca. Chega a queimar a pele, deixando manchas que duram meses, só para lembrar a vítima de que tudo é culpa do limão. Eu odeio limão, mas consigo superar! Porém, o limão tem marketing.
  • A pizza de muçarela ou mozarela, mas jamais “mussarela”, é uma fraude. Quem vai à pizzaria e percebe no cardápio dezenas de pizzas com ingredientes sensacionais e pede uma de muçarela só pode estar com sérios problemas. É preferível comer um misto quente ou pão com queijo a uma pizza de muçarela. Ela é inútil. Chega a judiar do gosto. Acho que os pizzaiolos devem rir com ironia a cada pedido de pizza de muçarela. Devem pensar: “temos bacon (a melhor invenção humana), palmito, tomate seco e o cara pede pizza com muçarela!”. E ri! A pizza de muçarela é uma fraude, mas tem um pouco de marketing.
  • O pato é um pobre coitado, não consegue fazer nada certo. Não voa bem, não nada bem, não canta, enfim, não faz absolutamente nada direito… por isso deveria ser deputado. O ovo da pata é muito mais forte do que o da galinha, mas não tem marketing. Ninguém vai ao supermercado comprar ovos de pata e dificilmente vai comer um pato assado no domingo. Nunca vi aquelas máquinas de assar carne assando um pato sequer. Pato não tem marketing. Nem no Natal! A gente come peru, frango gigante, leitoa, cabrito, carneiro, porco em forma de presunto, mas nunca um pato. O pato não tem nenhum marketing. Mais fácil comermos um coelho do que o pato.

Assim caminha a humanidade com suas esquisitices e gostos. Um dia eu vou superar o limão, a pizza de muçarela e o pato. Por enquanto, ninguém me convence de que todos eles são verdadeiras fraudes!